
De acordo com o Relatório Nacional de Justiça de 2020, no ano de 2019 foram quase 500 mil demandas judiciais envolvendo erro médico, no Brasil.
Com o advento da pandemia que até hoje assola o país, o número de ações cresceram ainda mais. Só em 2020, mais de 35 mil processos sobre o assunto foram iniciados.
É comum ouvirmos relatos de falha na prestação de serviços médicos que podem ter consequências leves ou muito graves, como o óbito do paciente.
No entanto, nem sempre há, de fato, erro do profissional especificamente, podendo ocorrer a situação por falta de estrutura do ambiente hospitalar, por exemplo. Foi o que ocorreu em muitos hospitais do Brasil, que não possuíam equipamentos suficientes, como respiradores, durante o auge de internações por COVID-19.
Por isso, é muito importante saber que erro médico e erro do médico nem sempre são sinônimos.
O assunto é muito complexo e pouco discutido, o que leva a muitos equívocos no momento de ingressas com a ação judicial. Pensando nisso, nosso objetivo é esclarecer algumas das questões que envolvem essa discussão.
O que é o erro médico?
É uma falha na prestação do serviço médico, que ocorre por:
- Imperícia: quando não há o conhecimento técnico, teórico e prático para a situação específica;
- Imprudência: quando existe o conhecimento técnico, mas ocorre uma ação sem cautela, sem utilização de todos os meios possíveis a que o médico tem acesso;
- Negligência: não configura uma ação e sim uma omissão, caracterizada pela falta de atenção e cuidado para realizar a atividade.
É possível perceber que o erro médico pode ser caracterizado tanto por uma ação, quanto por omissão profissional que causa dano moral ou físico ao paciente.
A obrigação do profissional da medicina é de meio ou de resultado?
Esse é uma questão essencial. Os profissionais de saúde não tem obrigação de resultado e sim de meio.
Mas, o que isso quer dizer? significa que o profissional não tem obrigação de curar o paciente, por exemplo. O que ele precisa é adotar todos os meios possíveis e existentes na medicina em busca do melhor resultado.
No entanto, essa regra não se aplica aos procedimentos estéticos. Nesses, geralmente, o profissional assume a responsabilidade pelo resultado oferecido.
Quais os direitos do paciente que foi vítima de erro médico?
O paciente, ou seus herdeiros (quando o erro levou a morte do paciente) terá direito a uma indenização, que pode ser por danos morais, materiais e estéticos (de forma conjunta ou separada, a depender do caso concreto).
Como será feita a prova do erro médico?
Depende do caso específico, podendo ser documental, testemunhal, etc. Além disso, será realizada uma perícia judicial, para analisar o dano causado e a existência de falha na prestação do serviço médico.
Erro médico é o mesmo que erro do médico?
Essa também é uma questão importante: saber quem responsabilizar. Isso porque o conceito de erro médico é mais abrangente e envolve falha de qualquer agente ou local de saúde, não sendo sinônimo de erro do médico.
Na prática, isso significa que enfermeiros, anestesistas, dentistas, veterinários, etc, e até mesmo hospitais e clínicas podem responder por erro médico.
Exemplos de situações reais:
A fim de demonstrar o que foi explicado neste texto, trazemos alguns exemplos de casos concretos em que o erro médico foi reconhecido judicialmente e mantido pelo Superior Tribunal de Justiça:
- Falha no atendimento de emergência que levou a morte do paciente (demora na adoção de medidas e ausência de solicitação de exames e procedimentos necessários). O dano moral arbitrado foi de R$ 70.000,00 a ser dividido entre os dois filhos do paciente que faleceu:
“DIREITO CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. MORTE DO PAI DOS AGRAVANTES POR ERRO MÉDICO EM ATENDIMENTO DE URGÊNCIA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. VALOR ADEQUADO. AGRAVO DESPROVIDO. 1. O Superior Tribunal de Justiça entende não ser cabível a revisão do valor da indenização por danos morais na via do recurso especial, ante a necessidade de reexame das provas juntadas aos autos, salvo em hipóteses em que verificada a natureza irrisória ou a exorbitância da importância arbitrada, caso em que haverá ilegalidade decorrente da ofensa aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. 2. Na hipótese, o montante não se revela excessivo ou exorbitante, visto que o Tribunal de Justiça condenou a ora agravante ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 70.000,00 (setenta mil reais), a serem divididos entre os dois autores, filhos do paciente que veio a falecer em decorrência de erro médico no atendimento de urgência recebido. 3. Agravo interno desprovido. (STJ – AgInt no AREsp: 1876297 RJ 2021/0111482-4, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 22/11/2021, T4 – QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 02/12/2021)”.
- Paciente com problemas no olho direito que, quando submetido a procedimento cirúrgico, teve interferência também no olho esquerdo, lhe causando dano estético. A indenização de danos morais e estéticos foi de 90 salários mínimos:
“ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO CONTRA DECISÃO QUE INADMITIU O RECURSO ESPECIAL. ERRO MÉDICO. DANOS MORAIS FIXADOS EM VALOR EXCESSIVO. REEXAME DO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 7 DO STJ. 1. O Presidente ou Vice-presidente do Tribunal de origem pode julgar a admissibilidade do Recurso Especial, negando seguimento caso a pretensão do recorrente encontre óbice em alguma Súmula do Superior Tribunal de Justiça, sem que haja violação à sua competência. 2. No caso em apreço, o paciente foi vítima de erro médico, visto que diagnosticado com defeito na pálpebra do olho direito; contudo, o agravante “houve por proceder à operação no outro olho, o ‘esquerdo’, que não reclamava qualquer modificação, por inescusável falta de atenção, que tinha por obrigação profissional empreender”, além disso a operação reparadora, que ocorreu posteriormente, não obteve resultado “insatisfatório do ponto de vista estético”. 3. Dessa forma, a Corte estadual concluiu de forma fundamentada que a responsabilidade é do agravante. Além disso, a fixação de danos morais e estéticos em 90 (noventa) salários mínimos não se mostra exorbitante. 4. Dessarte, para modificar tal conclusão a que chegou a Corte a quo, é necessário reexame de provas, impossível ante o óbice da Súmula 7 do Superior Tribunal de Justiça. Ademais, salvo em hipóteses de manifesta irrisoriedade ou exorbitância, o que não é o caso dos autos, o STJ não pode, em Recurso Especial, modificar o valor da indenização por danos morais e estéticos arbitrada nas instâncias ordinárias, com base nos elementos probatórios coligidos (Súmula 7/STJ). 5. Agravo conhecido, para não se conhecer do Recurso Especial. (STJ – AREsp: 1795666 SP 2020/0311445-3, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 13/04/2021, T2 – SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 01/07/2021)”.
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